Não esfriou tanto quanto esfriava antes, mas a ebulição global ainda nos permite sopa. Vamos aproveitar porque ano que vem pode ser tarde. Não que eu queira já começar pesando o clima.
Gostaria de pular de uma vez por todas a discussão que duvida da legitimidade da sopa como janta, porque ela é, inclusive, a única janta possível. E digo mais, ela também é almoço e café da manhã – se considerarmos o mingau de aveia uma sopa doce, o que é bastante lógico.
É natural que aconteçam equívocos em torno de um prato recordista em ser categoricamente mal executado, mas aqui os justos não pagarão pelos pecadores e eu defenderei a boa sopa com unhas e dentes se preciso for.
Como uma família, a boa sopa precisa de uma base firme para se apoiar e assim florescer a partir desses elementos primários que lhe foram oferecidos – tudo o que a sopa se tornará será uma consequência de seu momento inicial de formação. Diferente da família a sopa não precisará de quinze anos de análise para consertar os erros do passado.
A minha única regra universal em termos de sopa é a questão da cebola; sempre bem-vinda, é ela a espinha dorsal do sabor, que combinada à cenoura e ao salsão formam o power trio de nome soffritto, a base aromática mais consistente de mil e um caldos e molhos. Se você está no humor da sopa e não tem cebolas à disposição, considere uma ida ao mercadinho.
Ainda sobre o esqueleto de uma sopa bem-feita, é preciso enfatizar que a caramelização é uma fortíssima aliada, se você assa seus vegetais ao invés de só colocar tudo exalando a maior palidez do mundo na panela de pressão, a cara já é outra, a concentração de sabor é outra – claro, nada se aplica universalmente e uma sopinha de macarrão precisa da suavidade de uma batata cozida, mas experimente aí colocar uma legumada no forno e depois bater tudo com um caldo para tirar a prova dos nove.
E aí quando você se vê já no meio de uma sopa e precisa de um norte, pense em ervas, pimentas e acidez – esses são alguns dos amigos que te levaram ao panteão sopáceo. Um lindo aliado para compor o seu kit de ferramentas de cozinha é o barbante – amarrar todo verde que você tiver em casa e fazer um bouquet garni para nadar em sua sopinha é indicativo de muito sucesso.
Não existem palavras que caibam aqui na tentativa de retratação da acidez, talvez o elemento mais injustiçado na cozinha do dia-a-dia; ela muda tudo e tantas vezes é esquecida no seu vidro de vinagre de maçã do fundo da geladeira que venceu em maio de dois mil e quinze. Em termos de sopa, cabe tanta coisa: vinagre-não-vencido, um vinho branco espertíssimo, extrato de tomate, um iogurte/coalhada ou um limãozinho que seja na finalização. <3
Em termos de empratamento, quanto mais emperequetada está a minha sopa mais feliz eu estou com o resultado, é proporcional. Visto que fio de azeite + parmesão ralado por cima = uniforme básico de sopa, a alegria é abrir o armário e deixar que o limite se exploda; toste umas sementes de abóbora, pique umas tâmaras, faça uma farofinha de pão, coloque o gorgonzola para jogo, não tenha medo do picles de cebola; VIVA O PRESENTE; ABRA A IMAGINAÇÃO. A nossa sopa tem de se parecer mais com um manifesto. Tem de se parecer a representação gastronômica da canção Filtro Solar de Pedro Bial.
Desfrute de seu corpo
Use-o de toda maneira que puder, mesmo
Não tenha medo de seu corpo
Ou do que as outras pessoas possam achar dele
É o mais incrível instrumento que você jamais vai possuir
Enfim, a sopa né… aqui vão alguns de meus estudos sobre a sopa:
Pasta e Fagioli da Carla Lalli Music
Sopa de Cebola do Alex French Guy Cooking
Sopa de Tomate da Amelia Janta
Minha Galeria Pessoal da Sopa





Finalizo dizendo que também discordo de tudo que foi dito, como posso me atrever a, sabendo de nada vezes nada, vir aqui falar sobre a gigante e difusa instituição da sopa?
Coma a sua como achar que deve, e se me for permitido apenas um conselho: use filtro solar.